Antonio Quinto

Experiência do Paciente: Um Passo Adiante na Humanização do Atendimento de Saúde

O termo “satisfação do cliente”, originado na área da indústria e comércio, busca identificar os fatores que tornam as pessoas felizes, a fim de vender mais. Esse conceito, por mais que se considere as organizações de saúde como prestadoras de serviços, não se ajusta às pessoas que sofrem e temem com o que possa estar acontecendo em função de um agravo de saúde. Ninguém procura um serviço de saúde por prazer, mas por necessidade. Consequentemente, nesse momento o que mais conta é a forma como são acolhidas, atendidas e consideradas ao longo da jornada de cuidados que necessitam. A interação com os diversos elementos que compõem uma organização de saúde – médicos, enfermeiros e demais colaboradores, instalações, equipamentos, materiais e assim por diante – conformam na vida dos pacientes uma experiência de cuidado positiva, neutra ou negativa.

A Experiência do Paciente é o mais recente capítulo da humanização dos cuidados de saúde. Corresponde à soma de todas as interações, moldadas pela cultura da organização, que influenciam a percepção do paciente através da continuidade do cuidado [1]. Relaciona-se com a forma como o cliente/paciente apreende o que vê, o que ouve e o que sente quando recebe cuidados. Já se sabe que as condições do ambiente de cuidado e a empatia dos cuidadores (que precisam ser treinados nessa habilidade) influenciam no processo de cura. Ou seja, ambiente confortável, atencioso e seguro, cuidado tranquilo e reconfortante, transmissão de informações que auxilie na tomada de decisão consciente sobre os cuidados, tratamento honesto, respeitoso e digno[2] são elementos que sustentam uma experiência positiva do paciente.

A diferença fundamental entre a experiência do paciente e a satisfação do paciente é que na primeira a concentração se dá nas necessidades dos clientes/pacientes, enquanto a segunda orienta-se pelos interesses dos gestores. Enquanto a experiência do paciente aborda questões fatuais (ex.: Os profissionais de saúde falam na sua frente olhando para você?), a satisfação do paciente avalia questões subjetivas que incluem juízo de valor e expectativas (ex.: Como classifica a clareza das informações dadas sobre o seu agravo de saúde?).

Humanização do atendimento e estágio de desenvolvimento organizacional

A humanização do atendimento, faceta da assistência subordinada em grande parte ao comportamento dos colaboradores, apresenta uma correlação positiva com o estágio de desenvolvimento organizacional dominante. É possível um cuidado humanizado em uma organização situada no nível do gerenciamento caótico (onde se encontra a maioria das organizações de saúde), porém de forma limitada e a um custo elevadíssimo para os colaboradores que precisam suprir deficiências estruturais que impactam diretamente tanto neles quanto nos pacientes.

Em uma era de certificações, o Programa Planetree coloca-se como um sistema de certificação da humanização dos cuidados de saúde. Baseia-se em uma atuação mutuamente benéfica entre colaboradores, pacientes e familiares. Eis, de forma resumida, as 10 dimensões avaliadas no programa:

  • Arquitetura e design: Cada ambiente deve ser apreciado como uma casa e não como uma instituição, com valorização do humano e não apenas da tecnologia. O design favorece o envolvimento dos pacientes e familiares.
  • Aspectos nutricionais: A nutrição é parte do processo de cura, não só essencial para uma boa saúde. Os serviços de saúde tornam-se modelos de uma alimentação saudável.
  • Informação e Educação de Pacientes, Familiares e Colaboradores: Política de prontuário aberto que incentiva os pacientes a lerem seus prontuários e assim participarem do cuidado prestado.
  • Suporte à família e acompanhantes: Envolvimento dos familiares e amigos, oferecendo horário livre de visitas, mesmo na Unidade de Tratamento Intensivo, assim como a opção de familiares presenciarem procedimentos invasivos e de ressuscitação. A terapia com animais de estimação pode melhorar o humor, elevar a pressão arterial e a interação social.
  • Conforto espiritual: A espiritualidade cumpre papel especial na cura da pessoa como um todo. Dar suporte aos familiares e à equipe de saúde na correlação com seus próprios recursos internos melhora o ambiente da cura.
  • Toque humano: O toque reduz ansiedade, a dor e o stress e beneficia pacientes, familiares e equipe de saúde.
  • Arte, música e entretenimento: Música, contadores de histórias, palhaços e filmes engraçados criam atmosfera de serenidade e diversão. Obras artísticas nos quartos dos pacientes, áreas de tratamento e carrinhos criam a ambientação acolhedora.
  • Terapias complementares: Aromaterapia, acupuntura e Reiki são exemplos de opções que podem ser oferecidas, além das modalidades clínicas de tratamento.
  • Comunidade: Trabalho em escolas, centros de terceira idade, igrejas e outros locais fazem com que os hospitais redefinam a saúde e o bem-estar da comunidade como um todo.
  • Interações humanas: O atendimento personalizado para os pacientes e familiares cria um ambiente humanizado para todos.

As dimensões acima referidas, como destaca Lara Gilpin, pioneira do Planetree, parecem simples e básicas, porém facilmente negligenciáveis[3].

A relação mais provável da acreditação de organizações de saúde com o gerenciamento da experiência do paciente encontra-se no fato de que, ao expressar um determinado grau de maturidade organizacional, contribua para o desenvolvimento consistente de técnicas que aprimorem a experiência do paciente.

Eis uma tarefa inovadora para as organizações de saúde: substituir a tradicional avaliação da satisfação do cliente pela avaliação da experiência do paciente.

[1] The Beryl Institute. www.theberylinstitute.org. Acessado em 03/dez/2016.

[2] Patient experience strategy. University Hospital Southampton. NHS Foundation Trust, dec 2012 . www.uhs.nhs.uk/Media/Controlleddocuments/General/Patient-Experience-Strategy.pdf. Acessado em 03/dez/2016.

[3] Planetree. www.planetree.org. Acessado em 03/dez/2016.

Antonio Quinto

Médico psiquiatra, Mestre em Administração pela UFRGS, Especialista em Avaliação de Sistemas e Serviços de Saúde, Membro do Conselho Editorial da Revista de Administração em Saúde da Associação Paulista de Medicina. Fellow do Colégio Brasileiro de Executivos da Saúde (CBEXs). Avaliador Sênior do Instituto de Acreditação Hospitalar e Certificação em Saúde - IAHCS/ONA e professor convidado dos cursos de especialização do IAHCS/Fasaúde e da Faculdade Unimed, de Belo Horizonte (MG). Diretor de Provimento de Saúde do IPE-Saúde.

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